quinta-feira, 28 de julho de 2011

Capítulo 15: A missão da Cupido

— Por que convidou o Caio?
— Porque estou afim dele...
Renata começou a gargalhar:
— Como nunca me disse isso?!
— Também tenho meus segredos... tente respeitar minha individualidade!
— Desculpa. – Renata sorria em silêncio enquanto manobrava o carro. — Vamos pegar Luciana?
— Sim, falei com ela antes de sairmos.
Pararam em frente ao prédio de Lu e pediram que o zelador interfonasse. Enquanto esperavam, Renata se divertia com Camila.
— Camila, é sério mesmo? Você quer o Caio?
— Qual o problema?
— Bom, nenhum... ele até faz o seu tipo: grande, másculo... mas é que você nunca havia comentado nada...
— Sou tímida.
Estava formado o ápice da gargalhada gostosa de Renata. Não acreditava em como sua amiga podia ser tão cínica. Luciana chegou bem no momento da explosão de riso.
— Nossa, estão bem animadas! – entrou Lu no carro após beijar as amigas. Renata não se continha e mal conseguia falar. Camila lhe dizer, deslavadamente, que era tímida era a maior piada que poderia ouvir nos últimos tempos. Antes que Rê voltasse a si... Camila tomou a frente.
— Estávamos falando de homens... eles são sempre engraçados.
— E qual era a piada?
Quando Renata contaria o que havia acabado de ouvir, Camila a interrompeu:
— Nada de mais, é que Renata hoje está mais idiota que o normal.
Rê a olhou de canto de olho sem entender.
Quando chegaram à tal choperia e estacionaram, Renata puxou Camila de canto:
— Por que Luciana não pode saber?
Camila não tinha pensado numa resposta e vacilou:
— Ah... porque não sei se vai dar certo... e ainda tem a questão de trabalharmos no mesmo lugar...
— Mas a Lu é sua amiga!
Cá fez expressão de impaciente:
— Rê... olha só... depois te explico. – e saiu entrelaçando o braço de Luciana que estava mais adiante.
Só um escorregão de uma cupido aprendiz.

A choperia era bem agradável, nada de diferente, nem especial, mas era agradável. Muitas mesas espalhadas dentro e fora do bar, havia um pequeno palco e o músico era muito bom. A noite estava quente e, consequentemente, o lugar estava cheio. Logo que surgiram ouviram cantadas vindas de todos os lados... as três belas mulheres olhavam ao redor para encontrar Caio que se levantou de uma das mesas onde estavam seu primo... um bonito moreno de expressão carismática e um amigo... um belo loiro de expressão cafajeste.
“Ele pensou em tudo”. – pensou Camila assim que se sentaram. “Um para cada uma... Será uma noite difícil de administrar”. Cupido logo percebeu que Renata e Luciana não haviam gostado muito da surpresa. Camila disse ao telefone que Caio não levaria mais ninguém... mas o tal primo era o dono do bar... “agora já foi”.
As bebidas foram pedidas e a conversa rolava de maneira animada. Os três eram muito bons de papo, eram inteligentes e educados. Camila fez questão de se sentar ao lado do loiro com cara de cafajeste e Renata não entendeu – fez expressão de surpresa, arqueou uma das sobrancelhas, tentou chamar a atenção da amiga, mas, propositalmente, Camila mal olhou para os lados no momento de se sentar. Caio fez o possível – de maneira que não desse na vista – para se sentar próximo de Luciana. Sobrou para Renata o médio empresário que não parava de sorrir e dizer o quanto ela tinha olhos lindos; mas a “pegadora” já não vivia mais seus dias de caça nem de glórias. Conversava com o Primo, mas sem segundas intenções... na verdade estava um pouco tensa porque percebia que a conversa entre Luciana e Caio estava agradável demais e não conseguia escutar sobre o que falavam. “Ah! Imagina! Eles são colegas de trabalho... devem estar conversando sobre coisas da redação...” – pensava sem desgrudar os olhos dos dois – vez ou outra disfarçava e sorria para o sorridente Primo. Camila, por sua vez, divertia-se com o humor inteligente do Cafa, que usava de seu manual de sedução e ela sabia disso, já que também era usuária assídua, conhecedora de todas as lições. Mas, mesmo conversando com o mocinho, não deixava de observar o movimento de olhos entre Renata, Luciana e Caio... cada movimento era detectado e parecia que tudo ia bem até aquele momento. Porém, sabia que logo algo explodiria... ainda mais se a conversa entre os casais continuasse tão animada.

Luciana sempre gostou de conversar com Caio na redação e até chegou a desconfiar de que ele sentia algo mais por ela. Nunca deu crédito a isso porque nunca soube de nada efetivamente, além de não estar interessada. Ali, naquele bar tinha a oportunidade de conhecê-lo melhor e pode constatar que era um cara bem legal, inteligente e engraçado. Ele contava alguns “causos” e acabavam rindo bastante. Ela percebeu que, como a música era alta, as pessoas da mesa haviam se isolado em casais e só aí caiu a ficha. Olhou, imediatamente, para Renata, que conversava com o Primo compenetrada no assunto, fosse ele qual fosse. Ele, vez ou outra, falava muito próximo ao ouvido dela e isso incomodou demais Luciana, que se mexeu na cadeira e decidiu concentrar-se na conversa com Caio, caso contrário, estragaria sua noite e a dos outros.
“O que tanto conversam? Por que tanta risada?” – perguntava-se Renata enquanto observava os dois num papo cada vez mais descontraído... e Caio cada vez mais próximo de Luciana. Quando percebia que o olhar de Lu viria em sua direção desviava-se e voltava à conversa com o Primo... nem sabia mais sobre o que falavam.
“Olha só como eles estão se olhando! O primo do Caio está comendo Renata com os olhos!!!” – indignava-se Luciana enquanto ouvia a voz de Caio longe, às vezes, quase imperceptível. Estava ficando nervosa com aquela situação... não estava preparada para ver Renata beijar outra pessoa em sua frente... ainda não.

De repente, num acesso de fúria interna das duas, os olhares se cruzaram e ambas entenderam que uma pretendia provocar a outra. Interpretações...

Renata resolveu esclarecer uma coisa.
— Vou ao toalete. Camila, pode vir comigo?
Camila se desvencilhou de uma das mãos bobas do Cafa e seguiu a amiga desconfiada. Se tivesse um escudo o usaria para se defender... Percebia a fúria da amiga no modo como andava. “Estou morta!”. Assim que entraram Renata bateu a porta com força e olhou Camila com raiva:
— O que significa isso, Camila?!
— O quê, Rê?!
— Para de cinismo! Não estou achando graça nenhuma. Que história é essa de dizer que está afim do Caio e deixá-lo no maior papo com Luciana? E esses dois caras?? Você disse que só o Caio estaria com a gente! Que merda é essa de querer formar casalzinhos, Camila???
— Calma! – Camila estava em apuros, sentiu que logo seria esmurrada ali. Tentou pensar em algo rápido, mas não conseguiu. — Eu não sabia que o primo dele ficaria na mesa e também não sabia que ele traria outro amigo.
De repente, uma multidão de mulheres com vontade de fazer xixi invadiu o banheiro e Camila respirou aliviada. O Destino mexendo os pauzinhos. Renata a olhou com olhos de ira profunda e disse próximo à amiga – que ela começava a considerar uma traíra.
— O que você pretende com tudo isso, Camila?
— Eu não tenho culpa. – foi só o que disse antes de sair quase correndo para a mesa. “Essa foi por pouco...” – respirou aliviada, porém insegura: “Será que fiz a coisa certa?”

Voltaram para a mesa. Renata já não fazia nenhuma questão de disfarçar seu mau humor... estava de saco cheio de tudo aquilo, aquele teatro ridículo. Primo percebeu que ela voltou diferente e perguntou o que estava acontecendo. Camila, por sua vez, estava tensa, mas algo lhe dizia que agia certo. Precisava tomar uma atitude que juntasse de vez suas amigas ou as separasse de uma vez por todas. O que não dava era para continuar como estavam... duas moscas mortas que não se decidiam, mesmo sabendo que se gostavam. Teve receio de Renata nunca mais falar com ela. A amiga a olhou com uma fúria que nunca havia visto antes naqueles olhos cor-de-mel brilhantes... Quase vacilou e contou seu plano, mas se o fizesse estragaria tudo. Estava nos planos de Camila ver a amiga consumida pelo ciúme, justamente daquela maneira.
Também observava Luciana e podia ver e sentir seu desconforto quando via Primo falar pertinho do ouvido de Renata. Lu parecia querer provocar, mas não tirava os olhos de Renata... não conseguia ouvir absolutamente nada do que Caio dizia sorridente. “Desculpa, amigo, mas você é carta fora do baralho” – pensou Camila e logo voltou sua meia atenção para o Cafa que acariciava sua cintura.
A certa altura da noite, Renata, que já estava prestes a enfartar, viu Caio beijar delicadamente o pescoço de Luciana.
Sem maiores explicações levantou-se dali e disse ao Primo que iria embora. Sem dar tempo de ninguém dizer nada, Renata saiu dali furiosa, cega de ódio... ou melhor, de ciúmes. Tinha vontade de bater em Luciana e naquele jornalistazinho barato e metido a garanhão. “Por que ela faz isso comigo?!!”. Era só o que seu pensamento doído gritava enquanto caminhava a passos brutos em direção ao estacionamento, sem ouvir os chamados de Camila e Primo, atordoados com a atitude dela. De repente, aquela mulher maravilhosa ficou tensa gradativamente até explodir e sair dali deixando todos, ou quase todos, sem entender nada.
Pois é... ela explodiu. Não aguentava mais! “Nunca reprimi o que sentia por ninguém... não posso fazer isso comigo!!!”. Sentia-se fraca, insegura, uma otária de máscara escondendo o amor que sentia... e sentia-se ridícula por aceitar migalhas de Luciana. Para ela, naquele momento, a amizade de Luciana diante de tudo o que ela, Renata, sentia não passava de migalhas.

Luciana também ficou paralisada. Não esperava aquele beijo do nada – claro que não foi do nada, pois Caio dizia coisas em seu ouvido há horas, só que ela não ouvia, apenas sorria para manter contato. Ficou bestificada com a atitude do mocinho e mais ainda com a de Renata, que saiu como um raio... a viu levantar, mas mal pôde vê-la sair... apenas o vulto de seu cabelo loiro... deixando o rastro de seu perfume.
Não sabia o que fazer, ficou numa mesma posição durante minutos, esperando quase sem ar que Camila retornasse do estacionamento. “Meu Deus, o que esse idiota fez?! Ele não tinha que me beijar... eu não deixei!!!”.
— Por que fez isso, Caio?! – perguntou Luciana depois de longos minutos encarando o rapaz com o cenho franzido.
— Fiz o quê? – o jornalista estava no mundo da lua!
— Por que me beijou???
— Como assim? Um beijinho no pescoço... Eu pedi e você deixou!!! – respondeu sem entender nada. Pensou que, talvez, Luciana fosse problemática.
— Não deixei. – quase gritou para que Caio ouvisse em meio àquela música insuportavelmente alta.
— Deixou sim!!! – ele pensava, naquele momento, que talvez ela fosse esquizofrênica.
— Me leva embora! – berrou já pegando a bolsa e caminhando para o estacionamento.
— Lu, desculpa! – melhor não contrariá-la.
— Me leva para casa?! – intimou novamente sem olhar para trás. Não se importava mais em ver Camila... queria ver Renata, dizer que não havia permitido aquele beijo – conscientemente – que queria conversar... pedir desculpas, dizer que a amava.
“Ela saiu daqui daquela maneira quando viu Caio beijar meu pescoço... Acho que ela me ama...”. Pois é... Luciana ainda “achava” que Renata a amava.
No carro apenas Caio falava. Pedia desculpas, mais e mais... não sabia mais formas de se desculpar. Tentava explicar que o beijo era de amizade, que não pretendia ofendê-la... que não sabia que ela era de uma religião que não permitia. No íntimo, pensava que Luciana precisava de tratamento psicológico por ser tão reprimida: “Por isso que nunca a vi com nenhum cara... tão bonita e tão louca!”. Luciana olhava a rua e calculava mentalmente quanto tempo levaria para estar em seu apartamento, pegar seu carro e ir em busca de Renata... “preciso aproveitar esse lapso de impulsividade intensa que corre em mim... não vou perder essa oportunidade – mais essa oportunidade de ser feliz com Renata...”. Escutava Caio dizer algo... algo como “sinto muito”, “não pensei que um beijo no pescoço fosse....” e “não sabia que você era virgem”. Ela não queria entender o que ele dizia... não a interessava.

Renata dirigia com raiva. “Idiota! Vai ter que me ouvir... vou dizer tudo o que tenho vontade, tudo o que está entalado aqui faz um tempão. Depois me liberto, fico livre para ‘pegar’ todas as pessoas charmosas da face da Terra! Quer saber... vou dizer tudo o que tenho vontade e depois beijá-la porque, logo que não vou querer mais a migalha da amizade dela, pelo menos preciso me despedir com louvor daquele beijo!”
Rê sentia todo o seu corpo arder. Tinha vontade de chorar, pois sabia que Lu era seu grande amor e que estava prestes a perdê-lo... mas estava disposta a investir no famoso “tudo ou nada”... se não pudesse ter Luciana inteira para ela não a queria mais como amiga... era torturante demais ver outras pessoas se aproximando dela como se não houvesse um fio de amor que as ligasse.
Chegou.
Estava parada de frente ao prédio de Luciana. “Esperarei ela voltar, direi o que tenho que dizer e vou embora... pra sempre!”.

continua...

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